quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

TELEBRÁS já cheirava podre em 2006

LEIAM ESSAS DUAS MATÉRIAS PUBLICADAS EM 2006 NA ISTO É:

Presidente e advogado da Telebrás protestam contra acordo que obrigou a empresa a pagar R$ 253,9 milhões a amigo do ministro Hélio Costa.

Uajdi Menezes Moreira, carioca, 58 anos, é amigo do ministro das Comunicações, Hélio Costa, há 30 anos. Trabalharam juntos no tempo em que o ministro era repórter de tevê. No sábado 22, os dois assistiram juntos a um show em Miami, nos Estados Unidos. Na véspera, a Justiça de Brasília havia homologado um acordo que tornou Uajdi um cidadão milionário. Diz o acordo que ele começa a receber imediatamente R$ 253,9 milhões. Quem vai pagar a conta é a Telebrás, até hoje vinculada ao Ministério das Comunicações. O negócio milionário é o resultado de um processo que tramita há oito anos. Um tempo pequeno em se tratando de demandas judiciais dessa envergadura que tenha empresas estatais em alguma das partes. Segundo juristas renomados, o acordo é suspeito e não apenas pelo tempo da demanda.

O primeiro a levantar suspeita sobre o desfecho do processo é o advogado Sérgio Roncador, contratado para defender a própria Telebrás. Ele atuava em 700 causas da empresa. Em maio passado, passou a cuidar de 699. Roncador foi afastado justamente do processo que interessava a Uajdi. A direção da Telebrás, segundo o advogado, chamou o caso para si. “Foi apenas nesse processo que eles procederam assim, é algo estranho”, comenta Roncador. O advogado alega que, antes de assinar o acordo, a Telebrás ainda poderia recorrer da decisão do Superior Tribunal de Justiça, que condenou a empresa a pagar cerca de R$ 500 milhões a Uajdi. “Era possível questionar o valor da dívida”, diz ele. O jurista Aristóteles Atheniense, vice-presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, concorda: “É extremamente grave a União ter de pagar isso porque, depois de esgotados todos os recursos, ainda há margem para ação rescisória, para reverter o que foi decidido.”

Uajdi, dono da VT1 Produções e Empreendimentos Ltda., processou a Telebrás por causa do famoso serviço 0900, aquele dos sorteios feitos pela tevê a partir de ligações telefônicas tarifadas. Ele foi o homem que trouxe a idéia para o Brasil. Fechou um contrato com a Embratel e a Telebrás para operar o sistema. Em troca, sua empresa recebia pelas ligações efetuadas. Em 1998, os pagamentos foram suspensos de forma unilateral. Uajdi sentiu-se lesado. É o início do processo contra a Embratel e a Telebrás. Uajdi alegava que as empresas deixaram de repassar o que lhe deviam. A cifra foi aumentando. A Embratel, privatizada, fechou um acordo com o empresário e foi retirada do processo em fevereiro do ano passado. A Telebrás ficou sozinha como ré. No dia 29 de maio de 2006, às 17h12, a juíza substituta da 11ª Vara Cível de Brasília, Mônica Iannini, deu 24 horas para a Telebrás pagar R$ 506,2 milhões à VT1. A estatal não recorreu. Em 9 de junho, dia em que foi assinado o acordo e mais de um mês antes de o mesmo ser homologado, Uajdi recebeu a primeira parcela do que fora combinado: R$ 59,5 milhões. O acordo lhe garante mais 40 parcelas de R$ 900 mil cada. A primeira vence neste domingo 30. Ainda como parte do entendimento, Uajdi passou a ser dono, também, de um crédito de R$ 107,9 milhões que a Telebrás tem com a Receita Federal. E de mais R$ 50,5 milhões que a estatal cobra judicialmente da Telesp. Total: R$ 253.942.990,05. Dinheiro da União. É a maior cifra já paga pela Telebrás desde a privatização das teles, em 1998.

Dos Estados Unidos, Hélio Costa disse a ISTOÉ que só soube do tamanho da causa há pouco mais de um mês, quando saiu a decisão da juíza. “Esse assunto ficou desconhecido, esquecido, abandonado até o instante em que a juíza tomou uma decisão”, declarou o ministro na quinta-feira 27. “Não tinha informação de que estava nesse ponto.” Documentos obtidos por ISTOÉ contradizem o ministro. Em 22 de novembro do ano passado, quatro meses após assumir o cargo, Hélio Costa recebeu em seu gabinete quatro volumes com um arrazoado de todos os processos movidos na Justiça contra a Telebrás. Entre eles, o da VT1. Ali estavam, detalhadamente, até os valores das causas. Em 4 de abril, o presidente da empresa, Jorge da Motta e Silva, alertou o ministro especificamente para o caso. “A Telebrás, senhor ministro, não tem caixa para cumprir a decisão judicial previsível, podendo levá-la à falência”, escreveu Motta. “Esse elenco de fatores explosivos, inclusive pela forte conotação social e política (...) faz com que a atual administração da Telebrás recorra a Vossa Excelência para buscar uma decisão institucional conjunta que permita construir uma saída para o impasse”, emendou. Era mais um dentre vários apelos da direção da Telebrás para que o Ministério agisse politicamente para preservar o patrimônio público. “Eu queria que o tema fosse levado até para o presidente da República”, disse Motta a ISTOÉ, na última semana. A Telebrás vinha pedindo ao ministro que pusesse a Advocacia Geral da União (AGU) para defender os interesses da empresa. Segundo Motta, seria uma forma de levar a causa para a Justiça Federal, o que poderia auxiliar a defesa. “Eu não tenho informação direta de que alguém mandou para mim um documento pedindo para eu passar para a AGU”, defende-se o ministro. Novamente, a documentação obtida por ISTOÉ vai de encontro à versão do ministro.

Em 7 de junho, dois dias antes da assinatura do acordo, Hélio Costa encaminhou oficío à Telebrás com um parecer da consultoria jurídica do Ministério, que autorizava o fechamento do negócio com a empresa de Uajdi. Ao final do documento, à mão, o ministro deu seu aval. “Aceito o parecer e encaminhe-se cópia ao presidente da Telebrás”, escreveu o ministro. Juristas ouvidos por ISTOÉ afirmam que, antes de assinar o acordo, a Telebrás poderia continuar recorrendo por caminhos judiciais. Seria uma forma de tentar reverter, ou pelo menos diminuir, o prejuízo. O processo poderia levar mais dez anos correndo na Justiça. Explica-se: a defesa da Telebrás foi até o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Tentou um agravo de instrumento antes de a empresa ser condenada a pagar a dívida. Não obteve êxito. Ainda assim, tinha 15 dias para impetrar um recurso especial. Não o fez. Foi o suficiente para o processo transitar em julgado e a juíza de primeira instância ordenar o pagamento à VT1. “Se a AGU estivesse no caso, a história seria outra. Sem ela, a Telebrás ficou vulnerável”, diz o presidente da Telebrás. “Nós insistimos para que a AGU entrasse nos processos porque a lei que criou a Telebrás prevê isso. Afinal, o capital é da União”, completa Motta. Um apelo que foi feito oficialmente. “A assistência da AGU provocaria o deslocamento da demanda”, registrou Motta em 4 de julho em ofício ao ministro. O jurista Ives Gandra Martins, um dos mais respeitados do Brasil, concorda. Segundo ele, por se tratar de uma empresa em que a União é acionista majoritária, caberia o ingresso da AGU no processo. “Cabe à AGU defender o acionista majoritário, que é a União”, afirmou Gandra.

Procurado por ISTOÉ na quinta-feira 27, Uajdi negou que estivesse com o ministro em Miami. “Não o vejo há muito tempo”, sustentou por telefone. Já Hélio Costa admitiu: “Estivemos juntos no sábado, mas foi um encontro casual.” Uajdi nega, mas é visto com freqüência no Ministério das Comunicações. O próprio Hélio Costa o desmente. “Ele já foi várias vezes ao Ministério (...) Ele tem amigos que tinham alguns processos caminhando sobre rádio ou televisão e, de repente, ele ia lá para saber qual o andamento do processo”, diz o ministro. “Ele esteve no gabinete pelo menos uma vez.” As reuniões entre os dois se estendem à casa que Hélio Costa ocupa no Lago Sul de Brasília. “Mas nós só conversamos sobre produção de tevê”, afirma o ministro. Tanto Uajdi quanto Hélio estavam em Tóquio durante o fechamento do acordo que definiu o padrão japonês para a TV digital brasileira. Os dois, entretanto, juram que não se encontraram por lá. E que nem sequer se comunicaram na capital japonesa.



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Ministério das Comunicações responsabiliza Telebrás por acordo de R$ 254 milhões que favoreceu amigo de Hélio Costa

O Ministério das Comunicações transferiu diretamente à estatal Telebrás a responsabilidade pelo acordo judicial que resultou no pagamento à vista de R$ 59,5 milhões, mais 40 parcelas de R$ 900 mil e cessão de créditos tributários equivalente a R$ 107,9 milhões ao empresário Uadji Menezes Moreira, da VT Um Produções e Empreendimentos Ltda. A ISTOÉ, o ministro Hélio Costa, amigo pessoal do empresário Moreira, afirmou: “Se havia um, dois, três recursos a serem feitos, que a Telebrás os fizesse. A empresa tem seu próprio departamento jurídico e poderia ter feito isso diretamente.” A declaração espelha o ambiente de desconforto entre o Ministério e a Telebrás – que, em última instância, é uma empresa subordinada à pasta de Hélio Costa – após a divulgação por ISTOÉ, na semana passada, do fechamento do acordo milionário. Interlocutores do ministro lembram que o presidente da estatal, Jorge da Motta e Silva, não é uma indicação pessoal de Costa, mas sim de seu antecessor, Eunício de Oliveira. No período em que Costa está no Ministério, desde julho de 2005, o presidente da Telebrás teve não mais do que dois despachos pessoais com o ministro. Na semana passada, ocorreu a terceira audiência, na qual Motta e Silva sofreu uma forte reprimenda. Os interlocutores do ministro garantem que Costa já tomou a decisão de exonerar o presidente da Telebrás. A demissão só não foi consumada porque a ala do PMDB que apoiava o ex-ministro Eunício dá sustentação política a ele.

O acordo entre a estatal e a VT Um foi assinado em 9 de junho deste ano, 11 dias depois de a 11ª Vara Cível de Brasília ter determinado à estatal o pagamento de R$ 506,2 milhões à empresa privada. A decisão foi motivada por um processo aberto por Uadji Moreira contra a estatal, em 1998, por quebra de contrato em torno da operação do sistema de ligações telefônicas tarifadas conhecido como 0900. Ele ganhou a causa em todas as instâncias judiciais até o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Mesmo assim, ainda havia a possibilidade de novos recursos após o último pronunciamento da Justiça. A disputa judicial e os meios de fazer a defesa da Telebrás, empresa de economia mista cujo maior acionista é a União, foram tratados em ofícios entre o presidente da Telebrás e o gabinete do ministro das Comunicações. Motta e Silva dirigiu-se a Costa e a seu chefe de Gabinete pedindo uma “solução institucional” para a questão, sugerindo a sua apreciação pela Advocacia Geral da União e, ainda, pelo Gabinete Civil da Presidência da República. “Se a AGU tivesse entrado no caso, a história seria outra”, disse o executivo a ISTOÉ antes da divulgação do acordo. Depois da chegada da revista às bancas, Motta foi chamado ao gabinete de Hélio Costa, onde encontrou um ministro furioso. Saiu de lá com um discurso diferente. “É um problema da Telebrás”, resumiu. A verdade é que o caso acendeu uma forte luz amarela dentro do governo e foi parar sobre a mesa do ministro-chefe da Controladoria Geral da União (CGU), Jorge Hage. O advogado-geral da União, Álvaro Ribeiro Costa, também destacou uma junta de advogados para averiguar todas as etapas do processo.

Uadji Menezes defende atuação do Ministério
A consultoria jurídica do Ministério das Comunicações alega que, durante a troca de correspondência oficial entre o órgão e a estatal, os advogados da Telebrás sustentaram que haviam esgotado todos os meios de evitar ou, ao menos, protelar a execução da última decisão judicial. Novos documentos obtidos por ISTOÉ, no entanto, mostram uma outra versão. Advogado contratado para defender a estatal, posição que ocupou até ser afastado do caso em 13 de julho, Sérgio Roncador apresentou cópias de mensagens eletrônicas enviadas a ele pela representante do departamento jurídico da Telebrás, Fátima Maria Cavaleiro. Um dos e-mails é datado do dia 13 de abril. Roncador lembra que, nessa data, o processo ainda não tinha chegado no fim da linha. Na mensagem, porém, Fátima pede para Roncador acompanhar a publicação da decisão judicial e “nada fazer sem a autorização da Telebrás”. A partir daí, obedecendo a orientação superior da empresa, Roncador parou de impetrar recursos. Na mesma mensagem, Fátima solicita ainda manifestação de Roncador sobre possibilidade ou não de recurso extraordinário. No dia 25 de abril, o advogado envia a resposta. Ele aponta os cuidados a serem tomados “caso entenda essa empresa pela interposição do RE (Recurso Extraordinário)”. No dia 2 de maio, Fátima encaminha nova mensagem a Roncador. “Tendo em vista a falta de requisitos específicos de admissibilidade”, diz ela, “a Telebrás não irá interpor recurso no processo” da VT Um. O acordo acabou fechado no dia 9 de junho, sem a participação de Roncador. “Cobrei várias vezes por telefone e ela falou que não era para recorrer”, afirma o advogado, que segue: “Não tem santo nesta história aí, não.”

ISTOÉ recebeu na semana passada uma carta em franca defesa da atuação do Ministério das Comunicações e da Telebrás durante o processo que resultou no acordo milionário. O autor, surpreendentemente, é o empresário Uadji Moreira. Ele discorre, no texto, sobre os esforços despendidos por Costa e sua equipe para conduzir corretamente a questão que, por fim, resultou num acordo que o fez receber de uma só vez um cheque de R$ 59,5 milhões, ter garantidas 40 mensalidades de R$ 900 mil, corrigidas pela Selic, e ainda ter direito a créditos tributários estimados em R$ 107,9 milhões. No conjunto, entre tantos elogios à postura do Ministério, ora Uadji Moreira passa a impressão de estar advogando contra os seus próprios interesses, ora mais parece o magistrado da questão. “A União não está obrigada a intervir em processos que a Telebrás funcione como parte”, registra o empresário. “Assim sendo, em momento algum houve qualquer ingerência do ministro das Comunicações no presente feito, já que juridicamente caberia apenas ao presidente da Telebrás decidir pela oportunidade e conveniência do acordo.” Em seguida, assinala: “O parecer do Ministério das Comunicações mencionado na reportagem não autoriza o acordo, mas apenas diz que caberia à Telebrás decidir pela realização da mencionada avença, salientando o interesse público no pagamento da quantia inferior ao efetivo débito”. Sabia-se que Moreira era amigo de Hélio Costa. O que não se conhecia era seu pendor para jurista.

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